Diante da continuidade dos ataques israelenses contra civis palestinos e centros de distribuição de ajuda humanitária em Gaza, o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Reginaldo Nasser afirma que não há esperança de mudança nas ações de Israel sem sanções duras por parte da comunidade internacional.
“Israel age fora de qualquer princípio de direito internacional desde que foi criado. É claro que nesse momento está ultraando todos os limites possíveis”, diz, em entrevista ao programa Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. “Infelizmente não é surpresa que [os novos ataques] aconteçam num momento em que uma pesquisa de opinião pública diz que 82% da população de Israel quer os palestinos longe de Gaza, quer expulsar os palestinos. Em outras palavras: quer fazer limpeza étnica.”
Para Nasser, não se deve esperar mudança de postura por parte do governo de Benjamin Netanyahu ou da população israelense. “O que temos que esperar é da chamada comunidade internacional, daqueles que têm poder militar e econômico, para que façam as devidas sanções e façam com que Israel pare com essas ações terroristas, genocidas, nunca vistas na história”, afirma.
Segundo o pesquisador, iniciativas como a Flotilha da Liberdade – embarcação com ajuda humanitária que partiu da Sicília com destino a Gaza no último fim de semana – têm valor simbólico, mas não devem surtir efeito prático. “Eu iro muito a atitude, são verdadeiros heróis. Mas acredito que não [terão efeito]. Israel só conhece uma linguagem: ou é a linguagem militar, ou é a linguagem econômica. Não tem outra linguagem. Isso está muito claro”, declara.
Nasser recorda que desde os primeiros momentos após os ataques do Hamas, em 7 de outubro, Israel anunciou a suspensão de água, comida e medicamentos para a Faixa de Gaza. “Eles estão fazendo tudo aquilo que prometeram. Quantos agentes humanitários já foram mortos por Israel? Quantos jornalistas? Crianças? Então, alguém que faz isso vai respeitar uma flotilha?”, avalia.
Nações ‘falam duro e agem suavemente’
O professor também minimiza o impacto de declarações de chefes de Estado europeus ou do reconhecimento simbólico da Palestina por países como a França. “Falam duro e agem suavemente. O presidente da França não tomou nenhuma atitude até agora. O reconhecimento da Palestina agora não vai adiantar absolutamente nada. Como é que eu vou reconhecer o Estado da Palestina com um genocídio em marcha?”, questiona. “Tem 700 mil colonos na Cisjordânia e cada vez mais estão ocupando. […] Isso é retórica pura”, critica.
Para Nasser, a pressão internacional que pode surtir efeito seria análoga à que derrubou o apartheid na África do Sul. Segundo ele, países como Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos têm poder para impor sanções econômicas a Israel e forçar um recuo. “Nem precisaria de ação militar. Israel pararia a guerra no dia seguinte”, acredita.
Em relação ao futuro da Palestina, o pesquisador destaca que o Hamas é hoje o grupo com mais legitimidade política entre a população, tanto em Gaza quanto na Cisjordânia. “Gostando ou não, é um fato. A Autoridade Palestina praticamente não existe mais. E, por outro lado, eles [Israel e aliados] não aceitam o Hamas”, analisa.
Mesmo que se chegue a um acordo de troca de reféns, alerta o professor, a situação humanitária continuará insustentável. “Gaza, antes do 7 de outubro, já vivia um inferno. Em 2012, a ONU [Organização das Nações Unidas] fez uma projeção de que os habitantes de Gaza não conseguiriam ar de 2020. E eles estão conseguindo com o genocídio, a duras penas”, lamenta.
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