Em assembleia realizada na tarde dessa segunda-feira (2), no Ginásio de Esportes dos Bancários, em Salvador, os professores da rede municipal da capital baiana decidiram, por maioria de votos, pela continuidade da greve. Há 29 dias paralisados e com intensa agenda de atividades, os docentes têm como principal reivindicação a revogação da Lei Municipal nº 9.865/2025, que, de acordo o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB – Sindicato), foi aprovada sem discussão com a categoria e distorce o plano de carreira dos professores.
Uma nova Assembleia Geral está marcada para a sexta-feira (6), às 14h, no Ginásio de Esportes dos Bancários para avaliar os rumos do movimento. A diretora da APLB Elza Mello salienta que o objetivo das atividades é pressionar a prefeitura para retomar as negociações.
“Esperamos que nesses dias nós sejamos convocados pelo Executivo Municipal para negociarmos, para que as negociações sejam retomadas e sejam revistos esses artigos dessa lei, que seja revogada a lei. Portanto, a responsabilidade pela continuidade da greve é unicamente do prefeito de Salvador”, afirma.
Rui Oliveira, coordenador-geral da APLB – Sindicato define a lei como “uma afronta à valorização da educação pública. “O que estamos vendo é o desmonte da carreira. O movimento vai continuar até que haja um recuo do governo e a revogação imediata dessa norma”, salienta.
Na manhã desta terça-feira (3), o professores fizeram um ato em frente à Secretaria Municipal de Educação; na quarta-feira (4), está previsto um seminário para análise e discussão da Lei 9.865/2025; na quinta-feira (5), um novo ato será realizado às 10h na Praça Municipal, em frente à prefeitura.
“Gratificação não é piso”
Em luta por melhores condições de trabalho, materiais pedagógicos adequados, valorização profissional e pelo cumprimento do piso nacional do magistério, o sindicato denuncia a aprovação da lei nº 9.865/2025, sancionada pelo prefeito Bruno Reis (União Brasil), em que o piso é alcançado mediante a incorporação das gratificações da regência de classe ao reajuste salarial proposto pelo Executivo municipal.
“O prefeito de Salvador distorceu completamente o nosso plano de carreira. Afirma ter concedido piso salarial, entretanto, pegou uma gratificação de regência de 45%, somado com o reajuste de 6,27%, e transformou em salário. Ou seja, atingiu piso, mas, na verdade, esse piso foi dado por nós mesmos, não é verdade?”, destaca Elza Mello.

A diretora também denuncia a falta de transparência na elaboração da legislação, que foi aprovada sem nenhum diálogo prévio com os professores. “Não dá para a gente aceitar esse tipo de ação, onde essa lei foi aprovada às escondidas sem que nós soubéssemos, sem ter negociado, sem ter tratado com a categoria, com a APLB – Sindicato. Portanto, a greve continua. Nós queremos a revogação da lei e uma retomada da mesa de negociação”, aponta Mello. “Não aceitaremos esse tipo de posição do Executivo municipal retirando o plano de carreira, retirando os nossos direitos”, completa.
Em coletiva de imprensa realizada na última terça-feira (27), Bruno Reis aponta que a prefeitura segue suposta interpretação do Supremo Tribunal Federal (STF), em que as gratificações fixas e permanentes fariam parte dos vencimentos dos professores.
“Dos 10 mil professores de Salvador, em 8% deles havia uma dúvida de interpretação entre o sindicato e a prefeitura. A prefeitura interpreta conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de que as gratificações fixas e permanentes, de 45% do salário, que são pagas a todos indistintamente, fazem parte dos vencimentos dos professores. Essas gratificações inclusive computam para efeito de aposentadoria. Volto a dizer: estamos falando de apenas 800 professores dos 10 mil”, salienta o prefeito.
Rui Oliveira contesta a declaração do prefeito e menciona a decisão do STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.167 contra a Lei 11.738, que regulamentou o piso salarial nacional da categoria.
“Ele fala, mas não mostra a súmula, não diz nem o número dela. O piso foi estabelecido em 2008, aí diversos estados pagavam o piso juntando gratificações. Em 2011, o STF julgou que, até 2011, podia juntar [as gratificações] para chegar ao piso. A partir de 2011, era proibido juntar as gratificações para alcançar a soma do piso. Então o prefeito fica blasfemando, ele quer criar uma narrativa que não existe”, ressalta o coordenador-geral.
O Brasil de Fato tentou entrar em contato com a Prefeitura de Salvador, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto.
Apoio aos professores
Na Câmara Municipal, a bancada de oposição tem se manifestado a favor dos professores grevistas e contra a postura da prefeitura. Por meio das redes sociais, a vereadora Marta Rodrigues (PT) salienta o descumprimento da legislação sobre a remuneração dos docentes.
“Salvador acumula uma defasagem de 58% nos salários dos educadores. A proposta de reajuste apresentada pela prefeitura não contempla o que é de direito da categoria. Mesmo com aumentos sucessivos no ree de verbas para a educação, inclusive via Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação], o município segue descumprindo a legislação. Além disso, a gestão municipal tem adotado práticas autoritárias, ameaçando cortar salários dos grevistas e tentando criminalizar uma greve legal e legítima”, denuncia.
No dia 29 de maio, a deputada federal Alice Portugal (PCdoB – BA) encaminhou um ofício ao ministro da educação, Camilo Santana, expondo a situação enfrentada pelos professores da rede municipal de Salvador e pedindo apoio do governo federal diante da postura da prefeitura com a educação pública.

O documento destaca que o prefeito de Salvador “não parece preocupado com milhares de estudantes sem aula e muito menos com os direitos legítimos dos profissionais da educação da capital baiana” e demanda que o Ministério da Educação (MEC) “busque intermediar o conflito para buscar uma solução que implique no cumprimento da lei e no fim do legítimo movimento grevista.”
Já nessa segunda-feira (2), a Frente Norte Nordeste Pela Educação também divulgou moção de apoio à decisão dos docentes. A nota destaca que a greve é um instrumento democrático e constitucional e conclama a Prefeitura de Salvador a retomar o diálogo com a categoria.
“Instamos a Prefeitura de Salvador a retomar imediatamente as negociações com a APLB – Sindicato, com vistas à construção de soluções que respeitem os direitos dos profissionais da educação e assegurem a qualidade do ensino oferecido à população”, salienta a moção.